Publicação lista espaços de resistência e luta, apontando locais fundamentais para a história negra e africana no Brasil, para promover visibilidade e reconhecimento. Há espaços conhecidos como o Pelourinho e outros ainda não patrimonializados
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) lançou a publicação “Lugares de Memória Negra e Africana no Brasil”, um mapeamento inédito de espaços históricos fundamentais para a preservação da cultura negra, da resistência e da ancestralidade africana no Brasil. A iniciativa é divulgada no dia que marca a morte de Martin Luther King, um dos mais conhecidos líderes negros do mundo, 4 de abril, e está em alinhamento com o Dia Internacional em Memória às Vítimas da Escravidão e do Comércio Transatlântico de Escravizados, celebrado em 25 de março. A data tem como propósito promover a reflexão crítica e a proposição de ações de reparação para a população afrodescendente.
A publicação faz parte da nova seção “Memória e Verdade” do Observatório Nacional dos Direitos Humanos (ObservaDH), plataforma virtual do MDHC que reúne indicadores e evidências sobre direitos humanos no Brasil. Os dados são baseados no “Inventário dos Lugares de Memória do Tráfico Atlântico de Escravos e da História dos Africanos Escravizados no Brasil”, publicado em 2013 pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pela UNESCO.
O levantamento identificou 100 pontos distribuídos por todas as regiões do país. A maior concentração está no Nordeste, com 44 locais, seguido do Sudeste (39), Sul (11), Centro-Oeste (3) e Norte (1). Entre os estados, a Bahia lidera com 23 lugares de memória, seguida do Rio de Janeiro (20) e Pernambuco (10).
Resgate da história
Lugares como comunidades quilombolas, locais de trabalho, de vida cotidiana e de práticas culturais negras, além de terreiros e igrejas fundadas por irmandades de grupos africanos e locais de revoltas, foram inventariados. O mapeamento viabiliza a implementação de políticas públicas nestes espaços, considerando que parte deles não foi patrimonializada até o momento.
Exemplos disso são o lugar onde ocorreu a Revolta de Carrancas, no município de Carrancas (MG), e o Campo da Pólvora, onde foram executados os escravizados envolvidos na Revolta dos Malês, e que hoje é uma praça e uma estação de metrô, na capital baiana, sem nenhuma referência pública àqueles acontecimentos históricos.
Há ainda locais mapeados que são espaços turísticos muito visitados, mas que a maioria das pessoas não sabe que guardam parte da memória negra. São os casos da praia de Porto de Galinhas, no litoral sul de Pernambuco, e o Mercado Modelo, em Salvador. No passado, estes foram locais de desembarque legal e ilegal – conforme a legislação da época – por onde pessoas escravizadas e traficadas do continente africano chegavam ao Brasil.
Pontos conhecidos
Entre os espaços listados estão o Largo do Pelourinho, em Salvador, onde africanos escravizados eram castigados, e o Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, que já foi o principal porto de entrada de africanos escravizados no Brasil e nas Américas. Reconhecido como Patrimônio Mundial pela Unesco, desde 2012, o cais foi revitalizado e aberto à visitação pública.
Outra área em destaque é o Quilombo dos Palmares, em Alagoas. Símbolo da resistência negra no país, o sítio arqueológico da Serra da Barriga, onde ficava o maior quilombo registrado do país, hoje abriga o Parque Memorial Quilombo dos Palmares.
Também estão presentes no mapa locais como a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (MG), a Casa da Tia Ciata (RJ), o Engenho Massangana (PE) – antiga propriedade escravocrata onde viveu o abolicionista Joaquim Nabuco, o Sítio Histórico de Alcântara (MA) e o Museu Afro Brasil (SP), que guarda importante acervo sobre a cultura e história da população negra no país.
Acesse o mapeamento completo na plataforma ObservaDH
Valorização
A coordenadora-geral da Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico do MDHC, Fernanda Thomaz, ressalta que a publicação do ObservaDH é uma forma de valorização da memória negra no Brasil. “Penso que é um momento importante para essa publicação, porque, se a gente pensar o tamanho do apagamento sobre a história, a experiência da população negra desde a escravidão até hoje, é fundamental destacar as contribuições dessa população africana e afrodescendente”, afirma.
Segundo ela, o mapeamento é essencial para o desenvolvimento de outras medidas neste mesmo sentido. “É caminho aberto para que novas ações e atuação no campo da política pública sejam realizadas em torno da população negra e pensando na memória da população negra”, conclui.
Sinalização dos espaços
Por meio de parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o MDHC pode receber consultoria de profissionais da área de arquitetura para a indicação metodológica mais adequada para a sinalização de 100 lugares de memória dos africanos escravizados no Brasil.
Essa etapa faz parte de um projeto mais amplo, conduzido pela Coordenação Geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico, do MDHC, que tem o objetivo de sinalizar esses lugares nas cinco regiões do país com placas, indicando que são locais importantes na história do tráfico de escravizados africanos no Brasil.
O projeto integra uma iniciativa conjunta entre os Ministérios dos Direitos Humanos e da Cidadania; da Igualdade Racial; da Cultura (MinC); e da Educação (MEC), e pretende sinalizar 100 locais em todo o país. Já foram instaladas placas na Serra da Barriga e no Cais do Valongo. A ação também conta com atividades educativas, como produção de materiais didáticos e realização de oficinas.
Fonte: Agência Gov | Via MDHC